Conheça a igreja que se sustenta sem pedir dízimo nos cultos

Fundada há mais de meio século, a Igreja Cristã Maranata (ICM) se destaca por algumas características singulares: os pastores são voluntários, e não há cobrança de dízimo em cultos.

Originada como uma solução criativa diante da falta de recursos para a remuneração pastoral, essa estratégia evoluiu e se transformou em regra inquebrantável. Isso permitiu à igreja se desenvolver sem a necessidade de coletar ofertas nem de solicitar contribuições financeiras nas cerimônias religiosas.

Com mais de 5 mil pastores e inúmeros membros engajados em trabalhos voluntários, a ICM exibe uma comunidade vibrante e dedicada. Esses voluntários não apenas se envolvem em atividades de manutenção e ensino, mas também assumem papéis cruciais no apoio espiritual e material uns dos outros.

Todos os pastores têm um ofício, por meio do qual sustentam suas famílias e contribuem para a manutenção da ICM. O pastor Josias Júnior, de 56 anos, é um exemplo disso. Há 11 anos, o publicitário de formação é uma das principais vozes da igreja. “Sou um caso raro na Maranata”, conta. “Sou funcionário da igreja, mas em virtude de minha formação profissional. Costumo explicar assim: das 8 às 18 horas, trabalho na ICM. A partir dali, viro voluntário e desempenho o papel de pastor.”

Alexandre Melo Brasil, de 61 anos, segue na mesma linha. Ele afirma que é pastor por obra divina, mas advogado previdenciário de profissão. “Nunca dependi da Maranata para absolutamente nada”, ressalta. “Ao contrário: os pastores são contribuintes da igreja. Meu dízimo é parte do trabalho que desempenho na minha profissão. O fato de termos um ofício não enfraquece nosso trabalho na igreja.”

O pastor Alexandre Melo Brasil afirma que é advogado de profissão, mas pastor por obra divina
O pastor Alexandre Melo Brasil afirma que é advogado de profissão, mas pastor por obra divi
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Minutos antes de explicar seu papel na ICM, Melo Brasil estava em uma reunião com fiéis do Uzbequistão. “Oramos, pregamos, fizemos cultos”, revela. “Com tradutor, claro, porque não falo uzbeque. Quando terminarmos esta ligação, voltarei ao trabalho. Tenho petições a fazer. À noite, irei ao hospital visitar um doente. Nossa vida é assim.”

O Ministério Leigo
Não há exigência de formação teológica para os pastores na Igreja Cristã Maranata. Em vez disso, a ICM oferece instruções doutrinárias por meio de seminários quinzenais. Essa iniciativa é parte de um programa de formação denominado Ministério Leigo. O processo de formação pastoral é extenso e intensivo: inicia-se com a posição de obreiro, seguido por diácono, ungido ao Ministério da Palavra e, ao fim, pastor.

Kezia Nunes, pós-doutora em educação pela Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), explica que a ICM escolhe seus pastores por vocação. “É um chamado do Senhor”, diz a voluntária do grupo Organização e Método, que fornece orientações para as famílias com base nos ensinamentos bíblicos e nas ciências humanas. “Todos na Maranata trabalham de forma voluntária. Isso não nos destitui de uma formação complementar, de uma exigência técnica. Os membros se formam a partir da dinâmica das relações da ICM.”

A pós-doutora em educação lembra que conheceu outras denominações evangélicas, mas sentiu desconforto ao saber que os pastores recebiam salário e que havia cobrança de dízimo nos cultos. “Isso não existe na Maranata”, salienta. “É um trabalho fortemente interessado em ajudar.”

Projeto de fé
O presidente da ICM, pastor Gedelti Gueiros, ilustra o ethos da igreja ao afirmar que o ministério não é profissão, mas, sim, um projeto de fé. Ele também compartilha sua visão pessoal sobre o dízimo. “Sou dizimista, porque entendi que é bíblico”, explica. “Uma coisa é o espiritual, outra coisa é o material. Não posso misturar uma coisa com a outra. Do lado material, fui muito abençoado. Então, o espiritual é tudo que quero.”

A estrutura financeira da ICM é meticulosamente organizada. Ali, as contribuições são exclusivamente dos membros. A gestão é transparente e criteriosa, afirma o pastor Amadeu Loureiro Lopes, responsável por acompanhar as doações e administrar o caixa da Igreja Cristã Maranata.

“No início, o Ministério Voluntário foi importante”, ressalta Loureiro Lopes. “Não tínhamos recursos. Mas tínhamos em nosso meio pastores que gostaram da igreja, adaptaram-se e se identificaram. Esse pessoal foi gerado dentro da própria Maranata. Nosso aprendizado do ministério foi no dia a dia do trabalho.”

O médico e pastor Amadeu Loureiro Lopes é um dos que colaboram com a Igreja Cristã Maranata
De acordo com os pastores Antonio Carlos Oliveira e Adaiso Fernandes Almeida, esse trabalho ocorre por causa da profunda conexão entre os fiéis e a igreja. “Por orientação que veio do Senhor, o ministério não é profissional”, salientam. “Cada um tem a sua profissão, não vivemos da Maranata. O nome pastor, para nós, não é título — é função, porque o pastor também vai à igreja para servir a Deus na mesma condição que os demais, só com a função diferente das ovelhas.”

Essa filosofia é aplicada consistentemente em todas as comunidades da ICM ao redor do mundo, incluindo as situadas fora do Brasil. É o que explica Ronildo Scherrer, pastor da Igreja Cristã Maranata na Flórida, nos Estados Unidos.

“O dízimo é uma questão de fé, à medida que você conhece o Senhor”, observa Scherrer. “Não fazemos menção nos cultos. Aqui, os irmãos entendem o momento adequado de começarem a dizimar. Se os membros têm condição de contribuir, damos a oportunidade de ofertar a Deus.”

Nesse cenário, o voluntariado emerge como um pilar fundamental na ICM. O pastor Luiz Eugênio, secretário-geral da ICM, destaca que a ajuda dos pastores e dos fiéis é motivada pela fé, pela gratidão e pelo desejo de participar do Evangelho eterno. “Temos fila de espera para fazer parte das equipes de voluntariado dos Maanains”, relata, ao ressaltar o comprometimento e o entusiasmo dos membros da ICM.

“A igreja não faz coleta de ofertas nos cultos, mas não critica nenhuma que o faz. A razão: o dízimo é bíblico. A forma que agimos, sem pedir dinheiro nos cultos, é nossa experiência de fé. Nada tem nos faltado.”

Senso de comunidade
A separação entre o material e o espiritual é regra na ICM, conforme explica o pastor Gilson Sousa, na Maranata desde 1980. A congregação procura manter o foco exclusivo no aspecto espiritual durante os cultos, de maneira a evitar qualquer interação financeira.

“A nossa prática se baseia no senso de comunidade”, diz o pastor. “Queremos contar com a fidelidade dos membros da igreja. Por isso, não fazemos coletas em cultos, para que não haja nada material durante a pregação.”

Desde a sua fundação, em 1968, em Vila Velha, no Espírito Santo, a ICM tem se expandido significativamente. A Maranata possui mais de 4 mil imóveis no Brasil e no exterior, todos adquiridos à vista.

Tal expansão, segundo o presidente da ICM, é fruto da fé da comunidade. “Sem críticas às igrejas que agem diferente no que concerne aos dízimos, pois é bíblico”, diz Gueiros. “Não nos consideramos uma igreja rica, em termos materiais.”

Conheça o Maanaim
A área ocupada do Maanaim Domingos Martins é de 370 hectares, com 200 mil metros quadrados de área pavimentada e 30 mil metros quadrados de área construída. A infraestrutura do local, invejável aos países de Primeiro Mundo, inclui alojamentos, restaurantes, estações de geração de energia, centros de tratamento de esgoto sanitário e sistemas de reutilização de água.

O engenheiro eletricista Weverton Suella, de 41 anos, é um dos fiéis que contribuem para a manutenção dessa ampla infraestrutura. Ele explica que, a cada 1 milhão de litros de água utilizados nos eventos, 800 mil litros de água tratada voltam para os mananciais. “O sistema tem capacidade para tratar 6 litros de esgoto por segundo”, explica Suella, na ICM desde a infância. “A água tratada pode ser utilizada em plantas, faxinas e descargas.”

O Maanaim possui também uma estrutura para a coleta de água de chuva. Esse sistema tem 12,3 mil metros quadrados e distribui-se em telhados e calhas, que podem ser utilizados para o aproveitamento dessa água. A tecnologia permite que o líquido seja enviado para um reservatório de 100 metros cúbicos.

Para o consumo exclusivamente humano, há captação de água pela perfuração de poços. Esse líquido é bombeado para um complexo sistema de reservatórios, entre unidades de fibra e de alvenaria. A quantidade de água captada pelos voluntários é suficiente para abastecer o Maanaim durante os eventos.

A Igreja Cristã Maranata ainda pretende ampliar a geração de energia solar nos Maanains, porque é renovável e não poluente. No momento, considerando apenas Espírito Santo e Minas Gerais, existem 800 unidades da ICM com autonomia energética. Mas esse número deve crescer nos próximos anos, visto que os fiéis estão concluindo estudos de viabilidade técnica para a implantação desse conceito em outros Estados.

Estima-se que esse sistema possa resultar em uma economia de 95% no valor das contas de energia das igrejas. Só não deve chegar a zero por causa dos impostos, tão certos quanto a morte. A mais-valia ecológica também é grande, tendo em vista que o uso de energia solar contribui para a preservação do meio ambiente.

A captação de energia solar pode ocorrer por meio de usinas heliotérmicas, termossolares ou painéis fotovoltaicos. No sistema da ICM, que utiliza os painéis fotovoltaicos, há apenas a dependência da luz do sol. Sempre haverá geração de energia, mesmo nos dias frios, nublados e chuvosos.

Alojamentos e chalés

Há 20 alojamentos coletivos e chalés, reservados para famílias e convidados. O Maanaim dispõe de 3,2 mil leitos.

Unidade médica e odontológica

A ICM tem uma equipe voluntária formada por dez pessoas, entre médicos, enfermeiros e técnicos de enfermagem. A unidade possui oito leitos, que englobam atendimento médico inicial e assistência médica complexa. Há também duas salas para atendimento odontológico. Os fiéis têm à disposição uma ambulância com UTI Móvel.

Auditório e salas de reuniões

Há dois auditórios no Maanaim, nos quais se realizam treinamentos e capacitação dos voluntários. Também existem três salas de reuniões. Em cada um dos auditórios, a capacidade é de 2 mil pessoas.

Refeitórios e lanchonetes

O Maanaim possui dez lanchonetes para atendimento ao público. Também dispõe de dois grandes refeitórios, capazes de receber 1,5 mil pessoas. A quantidade de refeições é calculada pelo número de fiéis inscritos nos seminários e nos encontros. Para um evento com mais de 2 mil pessoas, por exemplo, a ICM prepara 570 quilos de carne, 180 quilos de arroz, 120 quilos de feijão e 180 quilos de verduras e legumes. Alimentos como repolho, alface, salsa e cebolinha vêm das hortas plantadas no local. E as sobras das refeições vão para a compostagem, num sistema recém-instalado com base em biogás.

Segurança

Um sofisticado circuito de monitoramento, com mais de 60 câmeras, alcança todas as dependências do Maanaim. Em caso de ocorrência criminosa, a equipe de segurança aciona os agentes de segurança pública.

Educação ambiental

A ICM promove, desde cedo, um trabalho de educação ambiental. A iniciativa conta com a participação das crianças e dos adultos. Entre as tarefas, há o plantio de árvores e as atividades que envolvem coleta seletiva e preservação da natureza.

Corpo de Bombeiros

No Maanaim Domingos Martins, há plantão de 24 horas com brigadistas civis. Os profissionais são treinados por bombeiros militares do Estado. Esses grupos fazem procedimentos de primeiros socorros, captura de animais silvestres em área de ocupação humana e soltura em zona da mata, prevenção e combate a incêndios. Eles também fazem corte e poda de árvores em risco.

Conheça a ICM
A ICM foi fundada em 1968, em Vila Velha (ES). Os cultos, reconhecidamente objetivos, duram no máximo 30 minutos. A igreja foi presidida por Manoel dos Passos Barros, entre 1970 e 1986, e por Edward Hemming Dodd, entre 1986 e 2007;
“Maranata” é uma expressão de origem aramaica que, na tradução para a língua portuguesa, significa “vem, Senhor” ou “nosso Senhor vem”;
Desde 2007, a ICM está sob a direção de seu terceiro presidente, Gedelti Victalino Teixeira Gueiros, em conjunto com o Conselho Presbiteral, formado por 18 pastores;
O IBGE informou, em 2000, que a ICM tinha aproximadamente 280 mil integrantes. Em 2021, o órgão relatou um crescimento no número de fiéis: 356 mil. Isso representa uma alta de quase 30%. A maioria dos fiéis no país está concentrada no Espírito Santo: 37%; e
No Brasil, a Maranata tem mais de 5 mil templos. E está presente em 200 países.

Fonte Revista Oeste
Foto: Divulgação/Igreja Cristã Maranata